Região Centro-Oeste, 13 de fevereiro de 2025

Preço da mandioca sobe, mas ainda não compensa, diz produtor

Clima seco dificulta colheita, oferta para indústria cai e consumidor vai pagar mais pela fécula
Longa estiagem que atingiu a maior parte das áreas produtoras de mandioca está aumentando os preços da raiz — Foto: Canva/Creative Commoms

O produtor de mandioca Nelson de Paula Netto pretendia dobrar sua área plantada de 180 hectares da raiz no município de Rondon, no Paraná, neste ano, mas recuou. Ele alega que o preço da fécula de mandioca pago ao produtor pela indústria não está compensando, embora tenha subido pela sétima semana consecutiva.

Segundo pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, o valor médio registrado na semana de R$ 485,89 (ou R$ 0,8450 por grama de amido), representa uma alta de 1,5% frente à anterior. Mas, na comparação com o mesmo período do ano passado, o valor atual é 34% menor.

“A indústria aqui no noroeste do Paraná está pagando R$ 0,86 pela grama de amido de mandioca. Esse preço não paga a conta. O prejuízo é de R$ 10 mil por alqueire. Para compensar, teria que ser no mínimo R$ 1,10 a grama”, diz Nelson, lembrando que em 2022 a mandioca alcançou o maior preço histórico: R$ 2,17. “Meu pai dizia que na época plantar mandioca estava dando mais dinheiro do que roubar banco.”

Neste ano, o produtor diz que o clima seco prejudicou muito, dificultando o arranquio da mandioca mesmo com a colheita semimecanizada que usa em sua fazenda. Por isso, ele só colheu o necessário para “pagar boletos”.

O produtor de mandioca Nelson de Paula Netto pretendia dobrar sua área plantada em Rondon (PR), mas recuou — Foto: Arquivo pessoal
O produtor de mandioca Nelson de Paula Netto pretendia dobrar sua área plantada em Rondon (PR), mas recuou — Foto: Arquivo pessoal

Integrante da quarta geração de agricultores da família, Nelson se formou em gastronomia e foi dono de dois restaurantes, antes de voltar ao campo. Iniciou o plantio de mandioca há 8 anos com 20 hectares na região que é a maior produtora da raiz no país e foi expandindo a área todos os anos até chegar aos atuais 180 hectares. Ele também planta sorgo e cana e cria gado, mas o carro-chefe é a mandioca.

O amido de mandioca, também chamado de goma, polvilho doce ou fécula fécula, é um pó fino, branco, sem cheiro e sem sabor, que é extraído da mandioca no processamento e tem mais de 800 usos em indústrias de alimentação, têxtil, de papéis, de colas, de tintas, de embutidos de carne, de cervejas e petrolífera. Um quilo da raiz rende de 250 a 270 gramas de fécula.

A maior parte da produção brasileira de mandioca (ou manihot esculenta crantz), estimada neste ano em 18,8 milhões de toneladas (1,5% menor que a safra anterior), é destinada ao processamento industrial como fécula e farinhas.

O preço da mandioca para o consumo de mesa também vem subindo. Na última quinta-feira, no Ceagesp-SP, o quilo da raiz graúda estava cotado em R$ 1,65 ante o R$ 1,54 da semana anterior.

A maior parte da produção brasileira de mandioca, estimada neste ano em 18,8 milhões de toneladas, é destinada ao processamento industrial como fécula e farinhas — Foto: Arquivo pessoal
A maior parte da produção brasileira de mandioca, estimada neste ano em 18,8 milhões de toneladas, é destinada ao processamento industrial como fécula e farinhas — Foto: Arquivo pessoal

Falta de oferta

Fábio Isaias Felipe, pesquisador de mandioca e derivados do Cepea, explica que o preço da mandioca para indústria está subindo mesmo por falta de oferta devido à longa estiagem que atingiu a maior parte das áreas produtoras.

Segundo ele, o produtor deixou de colher a raiz e retomou o plantio, o que causou uma menor disponibilidade da raiz de segundo ciclo, que proporciona maior receita ao produtor porque concentra mais amido e tem mais produtividade.

“No cenário atual de baixa oferta, não vejo fundamentos para queda de preço antes de outubro”, diz Felipe, acrescentando que a demanda pela fécula está fortalecida porque as indústrias estão com estoques baixos.

Na mandioca, o primeiro ciclo se refere à colheita de raiz com 12 meses. No segundo ciclo, o tempo de colheita é de 24 meses. As regiões Norte e Nordeste são as maiores produtoras, mas vêm sofrendo constantes abalos pelo clima, segundo o pesquisador do Cepea. Por outro lado, a produção vem crescendo no Centro-Sul, especialmente em Mato Grosso do Sul, Minas e São Paulo, que já colhe 35% do volume total.

Indústria

Aleksandro Siqueira, diretor de novos negócios da Lorenz, maior processadora de fécula de mandioca do país, estima que até o final do ano o preço do produto vai subir ainda mais no mercado interno devido às condições climáticas adversas para a cultura, a transição de ciclo de plantio e a valorização cambial, que favorece as exportações.

No primeiro semestre deste ano, as indústrias do Paraná, Santa Catarina e São Paulo processaram 400 mil toneladas de fécula. No segundo semestre, a oferta deve cair para 250 mil toneladas ou 36,5% a menos.

Lorenz é a maior processadora de fécula de mandioca do país — Foto: Divulgação
Lorenz é a maior processadora de fécula de mandioca do país — Foto: Divulgação

“Com a falta de oferta, os preços vão subir, mas não devem atingir os mesmos níveis registrados na pandemia. O momento é de muita insegurança porque o preço está subindo toda semana para o produtor, mas não vem sendo repassado pelas indústrias ao consumidor. Esse repasse vai ter que acontecer no segundo semestre.”

Segundo ele, o Brasil nunca processou tanta mandioca como nos últimos dez anos e a produtividade tem dado saltos em função de tecnologia e novas variedades, mas, devido ao clima adverso, a indústria está fazendo neste ano acompanhamento 24 horas das previsões de chuva para se alinhar com o produtor, que tem evitado contratos longos.

“A maioria dos produtores de mandioca no Brasil são pequenos agricultores. Não é como a soja, que tem grandes produtores. Não podemos desestimular o produtor ou ele muda de atividade. É preciso fomentar a cultura para manter a sustentabilidade da produção, da compra e da venda.”

A Lorenz, indústria fundada em 1916 por alemães no Brasil para processamento da mandioca como alternativa à batata, teve sua massa falida comprada em 2015 pela indústria de proteína GTFoods. A empresa tem 4 fábricas para processamento da raiz, 3 no Paraná e uma no Mato Grosso do Sul, todas instaladas em áreas próximas da produção de mandioca.

No ano passado, a Lorenz processou 280 mil toneladas de fécula. A maior parte veio de 1.200 produtores parceiros que recebem acompanhamento técnico para escolha de variedades, manejo, adubação e poda, tudo visando um aumento de produtividade.

No final de 2022, a empresa iniciou o plantio próprio da mandioca, que hoje representa cerca de 10% do volume processado nas fábricas. O plano é chegar a 30% ou 40% de produção própria e focar no desenvolvimento de dois tipos: a mandioca orgânica para atender o mercado europeu e a mandioca waxy, que tem percentual de amido maior e é mais versátil.

Atualmente, além de atender o mercado interno, a Lorenz exporta seus produtos (fécula, amido modificado, amido pré gelatinizado, maltodextrina, dextrina e o polvilho azedo na versão orgânica) para 40 países, com destaque para Europa, EUA, Colômbia e Argentina. Os embarques respondem por 35% do faturamento da empresa, que foi de R$ 365 milhões em 2023, o equivalente a pouco menos de 10% da receita de R$ 3,7 bilhões da GTFoods.

A projeção da empresa é de aumento do processamento e das vendas, especialmente para o mercado externo.

“O Brasil tem uma posição de destaque no mercado da raiz no mundo pelo aumento da produtividade e por ser um produto natural, não transgênico, com muitas aplicações no mercado alimentício, substituindo o milho transgênico”, diz o diretor da Lorenz.

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