Olá, amigo pecuarista. Estamos no período das águas, pastos mais viçosos, densos, nutritivos, vistosos e uma infinidade de tons de verde no campo. Você está literalmente no paraíso. Quer saber por quê? Vamos a mais um valioso artigo que te ajudará a desvendar os segredos por trás de um ganho médio diário (GMD) de encher os olhos do pecuarista!
O verão brasileiro (período das águas) tem como características um alto regime de chuvas (pluviosidade), muita quantidade de luz durante os dias (os raios solares chegam com mais intensidade ao solo) e temperaturas quentes na maior parte do território nacional, especialmente na região centro-oeste, onde se concentra grande parte dos bovinos de corte do Brasil. Sabemos que, no período das águas, geralmente as fazendas de corte no sistema de ciclo completo estão com bovinos em fase de cria. E isso é ótimo, porque é justamente durante a cria e a recria que os animais têm melhor eficiência biológica no crescimento e desenvolvimento corporal e, consequentemente, no ganho de peso médio. A recria pode ser considerada uma importante janela de potencial produtivo dos animais. Também sabemos que é essa previsibilidade do clima tropical brasileiro, com duas estações muito bem definidas – chuvas e seca – que é favorável para o crescimento de plantas forrageiras, acúmulo de folhas, maior concentração de proteína bruta (PB) e menor concentração de fibrosos, principalmente durante o período das águas, quando há maior absorção dos minerais presentes no solo pela raiz das plantas.
A época das águas proporciona ao pasto uma forragem de elevado valor nutritivo com a utilização mais eficiente dos nutrientes pelos bovinos, já que encontramos uma alta quantidade de frações digestíveis nas folhas do capim. Dessa forma, aplicando o fornecimento de energia via suplemento proteico de baixo consumo, você vai contribuir para o aumento da produção de proteína microbiana no rúmen dos animais. E qual a consequência disso? Ganho de peso médio potencializado durante as águas! Contudo, a técnica não consiste simplesmente em dar suplementação de qualquer maneira ao gado, especialmente à recria, somente porque estão em crescimento. Para compreender esse potencial produtivo dos bovinos de corte a pasto e obter o melhor custo-benefício dele, o pecuarista precisa ter em mente alguns conceitos importantes:
- Escolher a forrageira mais adequada ao tipo de solo, relevo, clima e pluviosidade locais;
- Avaliar os requerimentos nutricionais dos animais, se equivalem ao que o seu pasto tem a capacidade de fornecer;
- Analisar a interação entre os fatores que podem influenciar na obtenção dos resultados almejados. Diga-se: o quanto você pode investir, preço do adubo, palatabilidade da forrageira, altura de entrada e saída e muitos outros.

As gramíneas tropicais, durante as chuvas de verão, possuem teores de carboidratos solúveis (energia) mais elevados, com menos quantidade de fibra indigestível. Tá bom, mas o que isso significa para a sua fazenda? É que as folhas mais jovens, tenras e verde-claras, principalmente no início do período de águas, tendem a aumentar a concentração não só de carboidratos, mas também de proteína bruta (PB) e diminuir a porção de fibra não-digestível. As forrageiras de clima tropical têm digestibilidade de 55% a 75% e PB de 7,9% a 17,4% da matéria seca (MS). Então, de acordo com as espécies ou cultivares, tipo de solo, fertilização, intensidade do pastejo e manejo do pasto, condições climáticas, teremos grandes diferenças nas proporções de PB e matéria orgânica digestível, influenciando na resposta do animal (ganho de peso).
Bem, agora que você já compreendeu o poder nutricional das plantas forrageiras durante o período das águas para a produção de bovinos a pasto, fica a questão: qual é o potencial produtivo dessas pastagens?
- Identifique a categoria animal disponível no período das águas (lembre-se de que cada categoria tem as suas necessidades nutricionais específicas).
- Bezerros de corte desmamados em junho (época da seca) com 210 Kg (7@) e ganhado por volta de 60 Kg de peso corporal (PC) até o mês de outubro, produzirão um animal com 270 Kg de PC (9@) no início da estação chuvosa (em novembro).
- Se o seu objetivo no sistema de produção for o ganho de 7@ na recria (com o início da terminação coincidindo com o final das águas), cada garrote inteiro (não castrado) deverá ter um GMD em torno de 1 Kg / dia durante as águas (novembro a março). E terminará essa estação com o peso de 420 Kg (14@).
- Neste período da recria, quando os animais estão com peso médio de 270 Kg a 420 Kg, é onde temos uma ótima janela para o crescimento dos músculos, especialmente de machos inteiros desde que atendidos os seus requerimentos nutricionais básicos para dado ganho de peso.
NOTA: cálculos levando em consideração 1@ = 30 Kg do peso vivo do animal.
De acordo com o software BR-Corte, o requerimento nutricional de MS, PB e nutrientes digestíveis totais (NDT) do animal para ganhar 1 Kg / dia é: 7,6 Kg / dia de MS, 1,09 Kg / dia de PB e 4,62 Kg / dia de NDT.

Para que você possa entender melhor essas contas e o potencial produtivo dos bovinos de corte nas pastagens tropicais brasileiras, temos que:
- Para um ganho de peso de 1 Kg / dia, precisamos diariamente de 7,6 Kg de MS de forragem, contendo 14,3% de PB e 61% de NDT. Será que este sistema de produção é possível?
- Trabalhos desenvolvidos na Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Jaboticabal, utilizando adubação anual em torno de 180 Kg / ha de N:P2O5:K2O e 160 Kg / ha de N (nitrogênio em forma de ureia); sistema de pastejo em lotação contínua e altura de pasto entre 15 cm e 35 cm do capim-Marandu durante o período das águas, mostraram que esse manejo proporciona valores de PB e NDT que atendem às exigências nutricionais para o GMD desejado.
- Lembrando que o desempenho é resultante do consumo de nutrientes, sendo assim influenciado pelo consumo de MS e concentração de nutrientes na forragem, e não pela composição química presente no solo!
Considerando que seja viável o ganho de peso de 1 Kg / dia com dieta exclusivamente à base de forragem, você poderia se perguntar: por que não observamos esse resultado impactante aqui nas fazendas de corte brasileiras? Vamos conhecer alguns dos impedimentos mais comuns para a implementação eficaz da pecuária de precisão?
- qualidade da forragem;
- consumo da forragem e de nutrientes;
- condições climáticas;
- fertilidade do solo;
- e manejo do pastejo.
Em vista das considerações acima, é essencial ter em mente que, apesar de no período das águas a massa de forragem ser alta (com elevada concentração de nutrientes), o pasto não faz todo o trabalho sozinho. São necessários:
- ajustes na taxa de lotação;
- regulação na oferta de forragem.
- os ajustes na lotação podem representar o fator mais limitante sobre o consumo e o desempenho de seus animais no período das águas.
Um ponto que precisa ficar muito claro na cabeça do pecuarista, para você não ser enganado por vendedores mal-intencionados, é: guardar a seguinte afirmação:
“É impossível explorar o máximo potencial de produção individual (ganho de peso) e a máxima produção por unidade de área ao mesmo tempo”. Mott (1960)
Se é assim, o que separa homens de meninos, amadores de profissionais, Zé Ruelas de pecuaristas visionários?
Bem, taxas de lotação mais baixas mantêm uma alta oferta de forragem (aumentam a seletividade e a ingestão / mais ganho de peso por animal). Só que uma baixa taxa de lotação leva à baixa produtividade por área. Por outro lado, taxas de lotação mais altas resultam na redução da oferta de forragem, o que limita o consumo e o desempenho por cabeça de gado. Fique atento para a dinâmica das forrageiras, já que o aumento da altura do pasto indica a maturidade das folhagens, o incremento da celulose e maiores teores da fração fibrosa, prejudicando o valor nutritivo. E, ainda que pastos de maiores alturas e com alta densidade proporcionem maior disponibilidade de massa de forragem, mais consumo de MS e melhor desempenho individual, os resultados práticos mostram que esse não é o caminho ideal a longo prazo. O que fazer então?
- Na 1° tabela abaixo, temos o consumo de forragem, a relação entre PB e matéria orgânica digestível consumida, e o consumo de energia metabolizável em pastos de capim-Marandu com 15 cm; 25 cm e 35 cm de altura, pastejado por recria Nelore inteiro no período de águas.
- Em todas as alturas de pastejo, foi utilizada suplementação de 0,3% do PC (16% de PB e 66% de NDT, com base no consumo de MS). Observa-se que o ganho de PC por animal aumenta com a altura do pasto; porém, a produtividade por hectare – influenciada pela taxa de lotação – diminui drasticamente (destaque em vermelho, na 1° tabela).
- Explore ao máximo o acúmulo de forragem, com valor nutritivo adequado, durante a estação das águas. De acordo com a tabela, se você considerar o rendimento de 50% de carcaça em recria Nelore, tem-se a produção de aproximadamente 26@; 19,3@ e 15,6@ por hectare, em pastos de capim-Marandu manejados com 15 cm; 25 cm e 35 cm, respectivamente, durante 84 dias no período das águas (GPH – destaque em vermelho, na 1° tabela).
- Complemente pasto e suplementos. Conforme mostrado no topo da 1° tabela: na menor altura de pastejo, há um consumo mais baixo de forragem, o que aumenta a necessidade de mais suplementação para manter o consumo total de nutrientes em MS / dia por animal (destaque em verde, na 2° tabela). Suplemento sozinho não faz mágica!
- O uso de altas taxas de lotação associado às baixas alturas de pastejo pode proporcionar maior produtividade por área; no entanto, sua adoção deve ser vista com cautela. Tem que se considerar a frequência de veranicos ou antecipação do período seco, o que pode tornar a forragem mais vulnerável aos impactos negativos e susceptível à degradação das pastagens (Taxa de lotação – destaque em vermelho, na 2° tabela).

DICA: Não realize superpastejo por tempos prolongados!
Ainda na tabela 2, mesmo que pastos de 15 cm de entrada (capim-Marandu) diminuam o ganho de peso individual dos animais (GMD), os garrotes inteiros tiveram ganho de peso acima de 1 Kg / dia. Nesse caso, ganho atribuído ao elevado valor nutritivo da forragem complementado pela suplementação de 0,6% do PC; e esta reduziu os efeitos negativos da baixa oferta de forragem (GMD – destaque em vermelho, na 2° tabela).
- Tudo isso foi comparado a animais-controle que receberam apenas suplemento mineral em pastos de capim-Marandu, entre 15 e 35 cm, revelando alta significância para o pecuarista.
É interessante você notar que o ganho de peso aditivo por hectare, em resposta à suplementação nas águas, é inversamente proporcional à altura do pasto. Assim, em pastos mais baixos, os resultados são mais expressivos, conforme mostrado nos dados a seguir: 799 Kg; 578 Kg e 436 Kg / hectare em pastos de 15 cm; 25 cm e 35 cm de altura, respectivamente (GPH – destaque em vermelho, na 2° tabela).

Vamos encerrar a nossa conversa de hoje com as seguintes TOP SACADAS:
1° SACADA
A maior parte do ganho de peso durante as águas provém das proteínas e matéria orgânica digestível da forragem, e são justamente as proteínas e a matéria digestível os nutrientes de maior consumo no total de alimentos ingeridos pelos bovinos na pastagem durante a estação das águas.
2° SACADA
A suplementação só garantirá um ganho de peso adicional em relação ao gado não suplementado, se os nutrientes e concentrações informados no rótulo da embalagem estiverem alinhados com as características químicas e disponibilidade da forragem. Suplemento é complemento, e não substituto de pasto!
3° SACADA
A necessidade de escolher o suplemento certo (marca, preço, composição e tipo) de acordo com as características da sua forrageira; o ajuste da quantidade (dose x custo benefício) de suplementação conforme a disponibilidade de forragem, e o cuidado de não suplementar demais os bovinos em pastos com alta disponibilidade, pois ficará inviável economicamente a médio e longo prazos!
Um abraço e até nossa próxima prosa.
Por: Raquel Azevedo. Bióloga no mundo do agro. CRBio: 126402/02-D